A Serra da Mantiqueira é uma das principais cadeias montanhosas do Brasil, concentrando sete dos quinze maiores cumes de altitude do Brasil e tendo o quarto maior pico do Brasil (Pedra da Mina). Possui também diversos fragmentos florestais de Mata Atlântica, de altíssima relevância para a conservação da biodiversidade. Recentemente foi definida como o 8º lugar mais insubstituível do planeta de acordo com artigo publicado pela revista Science e a IUCN. Paralelamente a estes atributos naturais, a Serra da Mantiqueira também tem um papel relevante na história brasileira, tendo sido o caminho escolhido pelos bandeirantes para algumas das principais rotas de colonização do interior do Brasil e possuindo uma tradição cultural, religiosa e gastronômica reconhecidamente rica e diversa.
O grande naturalista Auguste de Saint-Hilaire, ao cruzar a região de Passa Quatro, sentido Vale do Paraíba, em14 de março de 18 22, em função de sua visita à Província de São Paulo, relata muito bem esta conjunção entre as riquezas naturais e culturais que existem na Serra da Mantiqueira e fazem parte de sua história:
“Seguimos um vale bastante largo cercado de montanhas pitorescas e coberto de árvores no meio das quais se destacava sempre a majestosa araucária. Este vale é regado por um rio que da mil voltas e pelo qual passa quatro vezes para chegar aqui, donde lhe vem o nome de Passa Quatro. Suas Margens apresentam, alternadamente pastos, capões de mato elevado, terrenos cultivados entre os quais se vê a distancia em distancia grupos de pinheiros.
Pequenas casas acrescentam ainda nova variedade à paisagem. A nossa frente tínhamos a Serra da Mantiqueira, cujos cumes, bastante diferentes pelo formato, são cobertos de sombrias florestas. Nenhum outro vale lembra melhor os vales da Suíça do que este de que acabo de fazer a descrição”
Não é a toa que em 03 de junho de 1985 foi decretada a criação da Área de Proteção Ambiental da Serra da Mantiqueira (APASM), unidade de conservação federal de uso sustentável, que abrange 30 municípios dos Estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo. A APASM foi criada, seguindo consta em seu decreto de criação, para:“garantir a conservação do conjunto paisagístico e da cultura regional da Serra da Mantiqueira, parte de uma das maiores cadeias montanhosas do sudeste brasileiro, bem como os remanescentes florestais da região, a continuidade da cobertura vegetal do espigão central, a flora endêmica, a vida selvagem, principalmente as espécies ameaçadas de extinção e proteger os mananciais e as nascentes de cursos d'água existentes na região”.
Atualmente a unidade conta com uma equipe gestora composta por quatro analistas ambientais que são responsáveis pela gestão da unidade e a fiscalização dos 434.108 hectares de sua extensão. Além da equipe gestora, a APASM conta com sete brigadistas contratados por seis meses todos os anos e serviços de vigilância, secretariado e limpeza. Esta infraestrutura é deficitária para sua gestão, em se tratando do seu tamanho territorial e abrangência nos três estados, além das diversas interfaces que exerce junto à sociedade.
Desde 2004 a APA Serra da Mantiqueira conta com seu Conselho Consultivo, sendo este um espaço de participação da sociedade na gestão da Unidade e um fórum de discussão para fortalecimento da gestão participativa e na melhora das políticas públicas, promovendo a integração entre a comunidade e a gestão da APASM, o que tem dado bons frutos.
Em 2011 foi realizada a elaboração de um estudo de dados secundários, que deu início à elaboração do Plano de Manejo da APASM, sendo que em 2013 foi realizado o diagnóstico socioeconômico, histórico e cultural da unidade. Nesta etapa de elaboração do Plano de Manejo, que recebeu recursos da Câmara de Compensação Ambiental do Rio de Janeiro, foram realizadas 50 reuniões junto às comunidades rurais abrangidas pela unidade, estreitando a relação com estas comunidades e resultando no relatório sócio, econômico, histórico e cultural deste imenso e diversificado território. Apesar da importância deste diagnóstico, é necessário se buscar formas de garantir a disponibilidade dos recursos para a conclusão do Plano de Manejo, o que já vem sendo feito com auxílio do Conselho.
Além da APASM existem na Serra da Mantiqueira diversas unidades de conservação de proteção integral, como o Parque Nacional do Itatiaia (1º parque criado no Brasil), Parque Estadual da Serra do Papagaio, em Minas Gerais, Parque Estadual da Pedra Selada, no Rio de Janeiro e o Parque Estadual de Campos do Jordão, além dos Monumentos Naturais do Pico do Itaguaré e da Pedra do Baú, em São Paulo. Também existem diversas Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPN) criadas em propriedades particulares nesta Serra, que foram transformadas em unidades de conservação de caráter perpétuo a partir da vontade de seus proprietários.
Criado pelo Ministério do Meio Ambiente, por meio da Portaria nº 351 de 11 de dezembro de 2006 , o Mosaico de Unidades de Conservação da Serra da Mantiqueira tem o objetivo de integrar e ampliar as várias ações já existentes destas Unidades de Conservação para a conservação do patrimônio natural e cultural da região.
Políticas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) têm sido implementadas no âmbito dos estados e municípios como ferramenta de conservação da biodiversidade e manutenção do homem no campo. Esta estratégia de conservação busca garantir a proteção de nascentes e cursos d´água em propriedades privadas.
Recentemente foi criado o Consórcio de Ecodesenvolvimento Regional da Serra do Papagaio, em Minas Gerais, com objetivo de exercer a cooperação federativa para atuar na gestão ambiental integrada e no fomento de atividades econômicas compatíveis com a conservação ambiental, especialmente no entorno do Parque Estadual da Serra do Papagaio.
A atuação das organizações ambientais na região é de grande relevância para a manutenção da Serra da Mantiqueira. Diversas instituições focam suas ações nesta região, trazendo recursos para a execução de projetos de conservação, incentivando a pesquisa, fomentando a educação ambiental e a adoção de boas práticas nas comunidades rurais.
É lógico que apesar de todos estes esforços aqui elencados, a Serra da Mantiqueira está muito aquém da proteção que merece, devendo sim receber mais atenção por parte do poder público, da sociedade e da mídia nacional. Porém muito tem sido feito, seja por produtores e proprietários de terras, seja pelo poder público, entidades não governamentais, sociedade civil e entidades de classe. Este extenso esforço e dedicação voltados à proteção da Serra da Mantiqueira devem ser valorizados e servir de exemplo de que a conservação de um patrimônio nacional insubstituível deve ser feita unindo esforços de todos os setores, em prol da perpetuação de um bem da sociedade e da natureza brasileira.
Nenhum comentário:
Postar um comentário